terça-feira, 16 de agosto de 2011

O veto do Orgulho Hétero: dos tais “privilégios” das minorias



















O prefeito Gilberto Kassab (PSD) declarou ao jornal “Agora São Paulo”, do grupo Folha, neste domingo, 14, que irá vetar o Dia do Orgulho Heterossexual. "O heterossexual é maioria, não é vítima de violência, não sofre discriminação, preconceito, ameaças ou constrangimentos. Não precisa de dia para se afirmar", disse à publicação.

Mas muita gente parece não pensar assim. Comentários tanto aqui no blog como nas redes sociais diziam que os gays estavam cheios de privilégios, que o veto era preconceito contra héteros, numa espécie de "heterofobia" (desde que uma blogueira que se pensa “moderninha” e faz comédia com fofocas de famoso escreveu esse termo, ele me dá calafrios) ou ainda “vocês gays que se acham seres superiores, veja programas como ‘Queer Eye’ [for the Straight Guy, algo como ‘O Olhar Gay para um Cara Hétero’], devem mesmo baixar a bola para nós héteros”.

O que esse tal dia dos heterossexuais traz de estranho, além de uma mentirosa e inócua guerra entre héteros e gays, é revelar uma falsa ideia de privilégios das minorias para aqueles que não sofrem preconceitos.

Delegacia para mulheres? Pra que? Ela é igual aos homens. Só que quando uma mulher ía reclamar de um estupro, muitas vezes era humilhada porque a delegacia era formada por homens de mentalidade machista e não viam nessa prática – até porque não sofriam – um ato de violência extrema.

Cotas para negros? Pra que? Todos têm os mesmos direitos ao ensino. Só que os negros historicamente, depois da escravidão, foram parar nos extratos mais baixos de nossa sociedade e muitas vezes foram incapazes de estudar, ou quando muito conseguiam/conseguem fazer uma fraca escola pública.

Orgulho Gay? Pra que? Todos somos iguais. Só que os homossexuais só são iguais na hora de pagar os impostos, porque muitos dos direitos civis ainda não foram alcançados por essa população.

Em geral, temos a falta de generosidade com o outro ao proclamar a igualdade no papel para deixar debaixo do tapete as brutais diferenças da realidade.

Gostaria de fazer um mea culpa. Eu sou branco e como tal achei meio absurdo, um privilégio, quando saíram as cotas para negros nas universidades. Me posicionei contra e achei que estava filiado ao pensamento do ator e militante negro Milton Gonçalves que também, na época, se declarou contra as cotas. Claro que foi um engano ideológico meu, Milton tem suas razões profundas, as minhas eram a de temer pelos tais privilégios, eram rasas.

Minha opinião mudou quando olhei para o meu mundo e percebi verdades claras de um sujeito que se acha pouco preconceituoso. Estudei em duas universidades consideradas de qualidade e tanto a Puc- SP como a Usp tinham negros na minha sala. Eles estavam por lá, mas não como estudantes, estavam como assistentes, eram faxineiros, secretários, técnicos de laboratório.

Durante 8 anos que estudei cinema na Eca/Usp, teve apenas um negro na faculdade. Era Jeferson De, autor do Dogma Feijoada, manifesto que agitou os meios cinematográficos do país e dizia que “o negro brasileiro deve traduzir a sua própria realidade na tela”. Jeferson está atualmente lançando seu longa “Bróder”. Isto é, teve que ser um negro excepcional, pois só assim ele pode entrar em um curso cheio de brancos medianos – eu inclusive.

No melhor curso de cinema do país na época durante 8 anos teve apenas um negro como estudante, que teve que provar ser acima da média para poder estar no meio de nós. Refletir sobre isso, mudou totalmente minha opinião sobre um assunto polêmico como foi – e não deveria ser – as cotas de negros.

Existe alguma coisa bem errada no discurso sobre as tais “vantagens” que as minorias querem ter. Como existia algo de errado na minha opinião sobre as cotas e minha visão de privilégio dos negros. Pense nisso quando achar que os gays são cheios de privilégios e estão por cima, pois muitos continuam apanhando nas ruas apenas por serem gays e nada mais. E isso não é nenhum sinal de supremacia ou vantagem.

Escrito por Vitor Angelo às 16h57
Folha de SP - 14/08/11

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