quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Homossexualidade é mais aceita por maioria, diz estudo com 31 países



















Holanda, Dinamarca, Noruega, Suíça e Bélgica têm maior aceitação. Rússia, República Tcheca, Chipre e Letônia seguiram tendência contrária.

A grande maioria dos países se tornou mais tolerante com a homossexualidade, com a exceção da Rússia e de outras nações que tiveram regimes socialistas, revelou um estudo americano.

O relatório, elaborado pelo Centro Nacional de Pesquisas de Opinião da Universidade de Chicago, estudou as tendências gerais da atitude de mais de 30 países em relação à homossexualidade.

A aprovação da homossexualidade aumentou em 27 países, e diminuiu apenas em quatro: Rússia, República Tcheca, Chipre e Letônia.

Os cinco países com maior nível de aceitação da homossexualidade são Holanda, Dinamarca, Noruega, Suíça e Bélgica, segundo o informe.

Os últimos da lista foram sete ex-repúblicas socialistas, países da América Latina e da Ásia Oriental, além de Chipre, África do Sul e Turquia.

Polarização dos dados é bem óbvia, principalmente em torno da linha de IDH = 0,7 – considerado o limite inferior que separa os países categorizados como “Desenvolvimento Muito Alto” dos demais abaixo.

É estranho constatar a existência de países que achem que violações de direitos humanos contra um grupo específico de indivíduos não devam ser consideradas como um problema a ser investigado e debatido, talvez sob algum critério arbitrário de desumanização dos mesmos indivíduos. Mas não surpreende que os níveis de desenvolvimento humano destes países sejam, em sua maioria, largamente inferiores aos países que defendem o oposto.

Paises onde tem casamento gay são sempre os mais desenvolvidos e ricos e menos violentos, ao contrario os paises onde tem até pena de morte para os gays são os paises mais pobres, e violentos do mundo.


ALGUNS EXEMPLOS:
Paises com casamento entre homossexuais:
- SUECIA: Pib per capita: US$ 34.735, IDH: 0,885 " muito elevado ", taxa de violência: baixo
- PAISES BAIXOS: pib per capita: US$ 35.078, IDH: 0,890 " muito elevado ", pouco violência
- ISLANDIA: pib per capita: US$ 40 277, IDH: 0,869 " muito elevado " , taxa de violência: baixo
ECC ECC
paises onde homossexualidade é crime por causas religiosas:
-SOMÁLIA: Pib per capita: US$ 795 , IDH: 0,284 " baixo ", taxa de violência: muito elevado
- AFEGANISTAO: Pib per capita: US$ 758 ,IDH: 0,349 " baixo ", taxa de violência: esta em guerra...
- SUDAO: pib per capita: US$ : 2.522, IDH: 0,531 " médio ", taxa de violência: elevado
ECC ECC
Já no Brasil, que não tem casamento, mas nem homossexualidade é crime ele fica entre paises de media riqueza e de um bom IDH

SURPRENDENTE QUE OS PAISES QUE CRIMINALIZAM A HOMOSSEXUALIDADE SAO TAMBEM OS MAIS RELIGIOSOS FUNDAMENTALISTAS QUE AO MESMO TEMPO SAO OS MAIS VIOLENTOS.

P.s: no continente Africano apenas tem o casamento gay na África do Sul, que é o pais mais rico do continente africano, na America do Sul o único pais com casamento gay é a Argentina que é também o que tem o pib per capita mais alto e o índice de desenvolvimento maior da América do Sul.







terça-feira, 30 de agosto de 2011

Escritora Laura Bacellar fala sobre importância do Dia da Visibilidade Lésbica



















Quando se pensa em literatura homossexual logo vêm à cabeça nomes como Caio Fernando Abreu, Oscar Wilde, Glauco Matoso ou Jean Genet, dentre tantos outros escritores assumidamente gays. Mas não se pode esquecer que a Literatura é feita de histórias e personagens dos mais diversos, e que as lésbicas também escrevem e são objeto de escrita.

Para falar mais sobre isso no Dia da Visibilidade Lésbica, este 29 de agosto, o Mix conversou com Laura Bacellar, editora e escritora que enfrenta os desafios de ser lésbica, escrever sobre isso e fazer com que as pessoas se interessem por obras de temática homossexual feminina.

Ela é editora da Brejeira Malagueta (www.editoramalagueta.com.br) e uma das autoras do livro “Frente e verso - Visões da lesbianidade”, que ganhou lançamento nesta segunda-feira, na Livraria Cultura, loja das Artes no Conjunto Nacional, em São Paulo.

Qual o significado de um Dia da Visibilidade Lésbica? É relevante?
É muito relevante, porque de todas as minorias sexuais as lésbicas são as mais invisíveis. Primeiro por serem mulheres, e ninguém nessa nossa sociedade fala muito de mulheres em si, a preocupação é sempre sua relação com homens ou filhos. Depois que são homossexuais, um segmento de gente mal compreendido e sujeito a mil preconceitos. As mulheres, assim, são convidadas a ficar caladas sobre sua sexualidade e sobre seus amores, uma tendência que dá muito trabalho reverter. Mas é necessária para que homossexuais consigam ter uma vida mais aberta e feliz.

Como você definiria a atual realidade da lésbica brasileira? Avançamos? Regredimos?
Avançamos, não há dúvida. Homofobia já virou um termo de uso comum (infelizmente seu significado permanece também muito conhecido de lgbts brasileiros), as paradas se multiplicam e facilitam o entendimento pela população de que as minorias sexuais existem e não são tão esquisitas quanto imaginavam, há uma abordagem mais natural de gays e lésbicas pelos meios de comunicação. Mas lógico que ainda falta muito, e as lésbicas jovens, estudantes, as religiosas, as casadas ainda sentem uma pressão absurda para se calarem e se conformarem ao molde dito "correto" de comportamento.

Qual é a principal demanda da população de mulheres lésbicas brasileiras neste momento?
Serem reconhecidas, terem espaço para se encontrarem, falarem, verem umas às outras. Querem ter modelos de lesbianidade positivos, querem não ser atacadas ou violentadas ou sofrer quaisquer outras violências ainda se praticam contra mulheres homossexuais.

Como a Literatura pode ajudar na luta pela cidadania lésbica?
A literatura abre espaço no imaginário para cenários novos, para o exercício de maneiras diferentes de sexualidade e afetividade das expostas pela maior parte dos veículos de comunicação. A literatura permite que muitas leitoras se reconheçam nas histórias, que vejam seus dilemas retratados e que assim se sintam parte de um grupo em lugar de isoladas e diferentes. É um mecanismo muito poderoso de consciência e autoaceitação.

Quais os principais desafios em se manter uma editora com títulos LGBT?
Divulgar a editora quando há poucos meios que resenhem livros atualmente, e distribuir os livros em livrarias cada vez mais sem espaço e mais atulhadas de outras coisas que não livros. Fora que são pouquíssimas as livrarias com seções lgbt ou de sexualidade ou seja lá o que for. Os livros ficam perdidos naquele mar de publicações e não são encontrados pelos leitores que seriam seu público.

Você já sofreu preconceito por editar livros de temática homossexual?
Ah, sem dúvida. Muita gente do meio acha que literatura lésbica (e gay também, se não for sofrida e não acabar com todo mundo infeliz e morto) é uma subliteratura, um gênero que já chamaram de "folhetinesco" quando não de coisa pior. É engraçado que, quando alguém publica uma história de amor e sexo hétero, ninguém acha nada. Quando o tema é gay, vira fraquinho e sem conteúdo imediatamente...

No que você pensa na hora em que vai escrever para sua leitora ou seu leitor?
Eu penso em dizer algo que faça diferença, que a leitora fique feliz ou incomodada ou interessada em ler, mas que ela não encontre em outros lugares.

Você acredita que homens também lêem livros de temática lésbica? Por quê?
Sim, há muitos simpatizantes, muitos mesmo, que acham ridículo o preconceito que circula em nossa sociedade. E também há homens que se interessam em saber mais do universo das lésbicas. A nossa autora Rafaella Vieira, que escreveu “Depois daquele beijo”, um romance entre garotas adolescentes, tem tido resenhas em blogs os mais variados. Muita gente declara ser este o primeiro livro de temática homo que já leram, e que gostaram.

Como são selecionadas as obras que serão publicadas na Malagueta?
Nós nos interessamos por obras que prendam a atenção, tenham qualidade narrativa, personagens consistentes, tramas bem amarradas. E que retratem de forma interessante algum aspecto do universo das lésbicas, seja de que parte for do Brasil, seja de que idade ou condição social a autora escolha descrever.

Escrever para você é uma terapia contra tantas coisas chatas da vida real?
Sem dúvida. Quando a gente se sente inundada pela bobajada que dizem por aí, escrever algo a respeito dá um certo controle, alivia a situação.

Você sente falta de personagens lésbicas na televisão?
Como todo mundo que é lgbt. Cansa aqueles personagens que mal se tocam, que se olham a distância, que não expressam afetividade, não é mesmo? Que ridículo não mostrar afeto entre pessoas do mesmo sexo, como se fosse doença. Eu tenho certeza de que essa história de não mostrar beijo gay, beijo de lésbicas na TV vai ser considerada medieval daqui a uns dez anos, uma loucura incompreensível para as próximas gerações.

O que achou do fato de o primeiro beijo gay na televisão ter sido entre mulheres?
Pois é, rola o entendimento que o público se ressente menos de ver duas mulheres do que dois homens juntos. Bom, é melhor começar por algum lugar do que não fazer nada, então o beijo teve seu aspecto positivo, mas achei ruim a postura dura das atrizes, as falas bestas, o fato de as duas se vestirem de maneira convencional (e bem hétero), o fato de uma se apresentar como relutante e não querer dar qualquer continuidade ao contato. Mais uma mensagem de que é preciso reprimir a expressão do afeto.

O que esse beijo representou realmente para o Brasil?
Ah, foi bom para levantar discussões, teve mais vida nos blogs e sites do que na novela, mas tem chão para algo assim representar os 10% das mulheres homossexuais brasileiras, não?

E como a eleição de uma mulher para governar o País pode ajudar a realidade das mulheres lésbicas?
Uma mulher no poder não necessariamente ajuda as mulheres, ainda mais se ela entra no jogo como os homens. A Dilma levou uma série de mulheres para seu círculo de poder em Brasília, o que é bom em teoria, mas não se pronunciou claramente a respeito de nada em favor dos homossexuais e tem cedido vergonhosamente à pressão da bancada evangélica. O veto ao kit contra a homofobia que era para ser usado nas escolas foi um vexame, mil pontos negativos na minha medição da presidente. Parece que ela tem medo de ser vista como lésbica e faz questão de se distanciar de nossas questões. Se ela é hétero, não parece considerar as lésbicas merecedoras de sua atenção. Se ela é lésbica, faz aquele gênero trancada dentro do armário que nos trata mal para mostrar ao mundo que não tem relação com a homossexualidade. Uma pena.

Fonte: site do Mix Brasil - 29/08/2011


segunda-feira, 29 de agosto de 2011

No dia 29 de agosto, é comemorado o Dia da Visibilidade Lésbica






























































Os LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais) enfretam um problema que vem do fato de serem agrupados por serem distoantes da norma heterossexual: a saber, dentro da sigla cabem as mais diversas manifestações da expressão afetiva e identitária. O que agrupa também acaba por apagar. Assim, no dia 29 de agosto, é comemorado o Dia da Visibilidade Lésbica como forma de amplar a luta por direitos civis na sociedade.

Vítimas de discriminação de gênero, por serem mulheres, e de orientação sexual, por serem lésbicas, o dia 29 de agosto foi escolhido como o Dia Nacional da Visibilidade Lésbica, em 1995, no 1° Seminário Nacional de Lésbicas, para explicitar esta luta e promover a discussão das especificidades lésbicas tanto no movimento de mulheres como no movimento pelos direitos homossexuais.

Então, um brinde... fora do armário!


















































quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Será Deus homofóbico?



















Recente pesquisa do Ibope revelou que mais da metade dos entrevistados se manifestaram contrários ao direito de homossexuais constituírem uma família. Não foi revelada – e por certo não foi questionada – a orientação sexual dos pesquisados. Mas caberia. Aliás, a pesquisa, para ter maior legitimidade, deveria ser feita somente entre a população LGBT. Afinal, é a ela que diz respeito.

Qual a justificativa para perguntar a alguém qual o direito do outro? Quem poderia falar, com mais propriedade, sobre o desejo de casar, de ser professor, médico ou policial? Um dado consolador é que os jovens, as pessoas com melhor nível de escolaridade e maior poder aquisitivo se mostraram mais tolerantes. Pelo jeito esse é o caminho. Educação. Só ela permite melhor renda e mais condições sociais.

Talvez o resultado mais surpreendente seja o quesito que identifica a religião dos pesquisados. Os mais intransigentes são os que se dizem evangélicos ou protestantes, seguidos pelos católicos e os adeptos de outras crenças e credos. De qualquer modo, das religiões que existem, não deve haver nenhuma que não pregue o amor ao próximo. As mais próximas, por terem sido trazidas com a colonização, acreditam em um Deus que veio à Terra encarnado na pessoa do próprio filho. Jesus Cristo desde menino exercitou a tolerância. Em nenhuma de suas pregações incitou o ódio ao semelhante ou negou a alguém o direito de subir ao reino do céu. Basta lembrar que impediu que Madalena fosse apedrejada, multiplicou pães para dar de comer a quem tinha fome e morreu na cruz para salvar toda a humanidade.

Assim, cabe questionar qual a justificativa de evangélicos, protestantes e católicos se posicionarem de modo tão assustadoramente preconceituoso contra quem tem orientação sexual diversa da maioria, mas não significa alguma ameaça nem causa mal a ninguém.

Afinal, o que querem lésbicas, gays, bissexuais, transexuais e travestis são os direitos mais elementares: direito à cidadania, à inclusão social. Direito de terem sua integridade física resguardada. Para isso é indispensável a garantia de acesso ao trabalho, para exercerem a profissão que lhes garantir a subsistência. Também precisam que lhes seja assegurado o direito de constituírem família, terem filhos. Enfim, eles, como todas as pessoas, querem somente o direito de ser felizes.

Mas o que se vê nos meios de comunicação, em face de chocante número de concessões a segmentos religiosos é a instigação sistemática e reiterada ao preconceito e à discriminação. As caminhadas e marchas que proliferam, em vez de pregarem o amor ao Deus que professam, nada mais fazem do que incitar o ódio a um determinado segmento da população.

A tudo isso a sociedade se mantém indiferente. Como o legislador se omite, vem o Judiciário fazendo justiça e o Executivo criando alguns mecanismos protetivos. Ainda assim, não há justificativa para tamanha rejeição. Não se atina a origem de tanta perseguição. Ao certo não pode ser a suposta incapacidade de procriar. Esse óbice, aliás, nem mais existe, quer com o advento de modernas técnicas de reprodução assistida, quer pela disposição dos casais homoafetivos de adotarem crianças cujos pais não souberem amar a ponto de protegê-las. Deste modo, cabe perguntar: quem disse aos pregadores, padres e pastores que é pecado amar o seu igual? Quem lhes outorgou a missão de banir a diversidade sexual da face da Terra? Será que Deus é homofóbico?

Por Maria Berenice Dias
Advogada especializada em Direito Homoafetivo, Direito das Famílias e Sucessões



segunda-feira, 22 de agosto de 2011

O Dia do Medo Macho - Os “machões” da Câmara de São Paulo estão precisando de terapia



















Quando li nos jornais que a Câmara de Vereadores de São Paulo tinha aprovado um projeto de lei criando o “Dia do Orgulho Hétero”, minha primeira reação foi de indignação. Como cidadã que tem crises de bronquite por causa da poluição da cidade, em que ônibus, carros e caminhões circulam deixando nuvens de fumaça com monóxido de carbono, entre outras porcarias, sem que ninguém pareça fiscalizar. Como cidadã que tropeça nos buracos de calçadas quando anda a pé e já sofreu trancos na coluna quando anda de carro por causa da péssima pavimentação das ruas. Como cidadã que passa horas todo dia num trânsito empacado e é empurrada e machucada em trens e ônibus lotados porque o transporte público é insuficiente e ineficiente e a população que dele depende é tratada como gado. Como cidadã que testemunha a péssima qualidade da educação pública e do atendimento nos postos de saúde. Como cidadã que sofre nos períodos de seca com a qualidade do ar, mas teme a chuva porque ano após ano os mais pobres morrem soterrados ou têm suas casas destruídas por causa do descaso do poder público e de obras adiadas. Como cidadã que vive tudo isso na cidade mais rica de um país que é a sétima economia do mundo, ao ler a notícia minha primeira reação foi de indignação.

Afinal, será que os vereadores que deveriam honrar o voto da população não têm problemas reais para discutir no seu tempo muito bem pago com dinheiro público? Mais ainda ao saber que o autor do projeto, o vereador Carlos Apolinario (DEM) apresentou a proposta em 2005 e só conseguiu aprová-la, em primeira votação, no ano de 2007. Botou de novo a proposta em discussão em junho deste ano e, desde então, segundo a imprensa paulistana, estava emperrando a análise de outros projetos para, como chegou a ser dito, “vencer pelo cansaço”.

Quem é Carlos Apolinario, o homem que está tão preocupado com os gays? Como lembrou Fernando de Barros e Silva, colunista da Folha de S.Paulo, Apolinario é um adepto do troca-troca, pelo menos na política: “Já esteve no PMDB, passou por um tal de PGT, frequentou o PDT e hoje se abriga no DEM”. Mas, pelo empenho demonstrado, parece que aprovar o “Dia do Orgulho Hétero” era uma questão de convicção e de fidelidade para o vereador. E o projeto foi aprovado por 31 de 55 vereadores que só estão lá porque seus eleitores pensaram que fariam um bom trabalho.

Datas como o “Dia do Orgulho Gay” ou o “Dia da Mulher” ou o “Dia da Consciência Negra” fazem parte da luta pelos direitos básicos de parcelas da população que historicamente sofreram – e ainda sofrem – as consequências da discriminação e do preconceito por aquilo que são. Os gays, por exemplo, contra os quais o “Dia do Orgulho Hétero” se opõe, têm sofrido diariamente por séculos e continuam a ter ainda hoje sua vida ameaçada mesmo em cidades como São Paulo, em que os casos de homofobia aparecem com frequência alarmante nas manchetes da imprensa. Dezenas de pessoas são assassinadas por ano no Brasil por causa de sua orientação sexual. E, em julho, um homem teve parte de sua orelha decepada no interior de São Paulo ao abraçar seu filho porque foram “confundidos” com um casal homossexual – como se isso justificasse a violência.

A homofobia é um problema sério, que tem ameaçado a vida de cidadãos honestos, pagadores de seus impostos, que com seu trabalho ajudam a manter São Paulo e o Brasil funcionando. E a homofobia merece a preocupação dos vereadores de São Paulo. Em vez de se preocupar com isso, o que eles fazem? Aprovam uma lei que só vai acirrar a violência.

Em seu site oficial, Carlos Apolinario, que se autointitula “o vereador das mãos limpas”, discorre sobre “heterofobia” e “ditadura gay”. E assim justifica seu projeto: “Na verdade, meu projeto de lei que cria o Dia do Orgulho Hétero não significa um ataque à figura humana dos gays, que eu respeito. Meu objetivo é combater os excessos e privilégios praticados pelos gays”.

De fato, como todos sabemos, na vida real não há notícia de nenhum heterossexual sendo espancado por gays na Avenida Paulista ou discriminado na escola, no trabalho e em espaços públicos, como acontece com os homossexuais. Não há notícia de nenhum heterossexual ouvindo piadas nem risinhos por onde passa. Logo, o “Dia do Orgulho Hétero” pode ser interpretado como, no mínimo, uma provocação vulgar. Mas com consequências nefastas, na medida em que a homofobia tem causado a morte de seres humanos.

Como os heterossexuais nunca tiveram seus direitos nem sua vida ameaçados por causa de sua orientação sexual, não há justificativa para uma data como esta ser aprovada pela Câmara e fazer parte do calendário oficial de São Paulo. Como disse Pedro Estevam Serrano, professor de direito constitucional da PUC-SP: “Constitucional é (a lei). Mas, legítima no sentido humano, não é. Não é uma atitude de paz, é uma atitude beligerante”.

Por tudo isso, minha primeira reação foi de indignação. E, como cidadã, é indignada que devo me manter, já que a lei foi criada e aprovada por homens e mulheres públicos para ter repercussão e consequências públicas sobre a vida dos milhões de moradores de São Paulo. E com ecos no país e fora dele.

Mas, é sempre bom a gente dar a volta, e tentar compreender porque homens como Carlos Apolinario e os outros 30 que votaram a favor de seu projeto tiveram a atitude que tiveram. Sempre vale a pena vestir a pele do outro, ainda que em casos como este seja uma tarefa e tanto. A pergunta que me fiz foi a seguinte: “Por que homens e mulheres heterossexuais, que nunca tiveram sua orientação sexual questionada ou sofreram qualquer discriminação por causa dela, se sentem tão ameaçados pela homossexualidade do outro?”.

E segui com questões que me permitissem alcançar Carlos Apolinario e os outros 30: “Se eu me considero heterossexual e estou em paz com minha orientação sexual, por que vou me incomodar com a do outro? Por que preciso criar uma lei que se oponha ao modo de ser do outro, se ele e o mundo inteiro respeitam o meu modo de ser? Por que me sinto ameaçado por uma expressão da sexualidade que é pessoal apenas porque é diferente da minha?”. Por quê?

Em geral, a violência, seja ela física ou psíquica, é uma reação à percepção de ameaça. Você reage para se defender. Sente-se inseguro, arma-se (com pistolas, palavras ou leis) e reage com violência porque não consegue lidar de uma forma mais sofisticada com aquilo que interpreta como uma agressão. Se, na vida pública, não há nenhuma ameaça contra os heterossexuais sob nenhum ponto de vista, logo, não é aí que está o nó da questão. Portanto, é legítimo pensar que a ameaça possa ser uma percepção de foro íntimo para Carlos Apolinario e os outros 30. E, por dificuldades de lidar com essa questão no âmbito pessoal e privado, ela acabou se manifestando em fórum indevido, consumindo dinheiro público e acirrando problemas coletivos numa cidade que tem sido palco de crimes movidos pela homofobia.

Com isso não quero reforçar o clichê de que quem se sente incomodado com os gays pode estar com sua homossexualidade escondida no armário. Mas lembrar o que a necessidade de criar o “Dia do Orgulho Hétero” só desvela: a sexualidade é um território pantanoso e, para cada homem e mulher é pantanoso de uma maneira diversa. Não sei que tipo de perturbação moveu cada um dos vereadores que aprovaram a lei – e suas pulsões só acabaram por dizer respeito a mim e a todos os cidadãos de São Paulo porque eles fizeram dela algo público – fizeram dela uma lei.

Carlos Apolinario e os outros 30 não merecem o nosso escárnio, mas sim a nossa compaixão. Estes muitos homens e algumas mulheres precisam de ajuda, não de condenação. Preocupada com essa constatação, fui conferir seus rendimentos e verifiquei que um vereador de São Paulo recebe, por mês, R$ 15.033 de salário, além de R$ 16.359 de verba de gabinete para despesas variadas. Conclusão: dá bem para pagar uma terapia, dá não? Eles serão mais felizes e, mais bem resolvidos, poderão até se dedicar aos problemas reais de São Paulo. Nós todos, por razões humanitárias e de cidadania, agradecemos.


ELIANE BRUM - Colunista da Revista Época - 08-08-2011
Jornalista, escritora e documentarista. Ganhou mais de 40 prêmios nacionais e internacionais de reportagem. É autora de um romance - Uma Duas (LeYa) - e de três livros de reportagem: Coluna Prestes – O Avesso da Lenda (Artes e Ofícios), A Vida Que Ninguém Vê (Arquipélago Editorial, Prêmio Jabuti 2007) e O Olho da Rua (Globo). E codiretora de dois documentários: Uma História Severina e Gretchen Filme Estrada.
E-mail: elianebrum@uol.com.br
Twitter: @brumelianebrum











terça-feira, 16 de agosto de 2011

O veto do Orgulho Hétero: dos tais “privilégios” das minorias



















O prefeito Gilberto Kassab (PSD) declarou ao jornal “Agora São Paulo”, do grupo Folha, neste domingo, 14, que irá vetar o Dia do Orgulho Heterossexual. "O heterossexual é maioria, não é vítima de violência, não sofre discriminação, preconceito, ameaças ou constrangimentos. Não precisa de dia para se afirmar", disse à publicação.

Mas muita gente parece não pensar assim. Comentários tanto aqui no blog como nas redes sociais diziam que os gays estavam cheios de privilégios, que o veto era preconceito contra héteros, numa espécie de "heterofobia" (desde que uma blogueira que se pensa “moderninha” e faz comédia com fofocas de famoso escreveu esse termo, ele me dá calafrios) ou ainda “vocês gays que se acham seres superiores, veja programas como ‘Queer Eye’ [for the Straight Guy, algo como ‘O Olhar Gay para um Cara Hétero’], devem mesmo baixar a bola para nós héteros”.

O que esse tal dia dos heterossexuais traz de estranho, além de uma mentirosa e inócua guerra entre héteros e gays, é revelar uma falsa ideia de privilégios das minorias para aqueles que não sofrem preconceitos.

Delegacia para mulheres? Pra que? Ela é igual aos homens. Só que quando uma mulher ía reclamar de um estupro, muitas vezes era humilhada porque a delegacia era formada por homens de mentalidade machista e não viam nessa prática – até porque não sofriam – um ato de violência extrema.

Cotas para negros? Pra que? Todos têm os mesmos direitos ao ensino. Só que os negros historicamente, depois da escravidão, foram parar nos extratos mais baixos de nossa sociedade e muitas vezes foram incapazes de estudar, ou quando muito conseguiam/conseguem fazer uma fraca escola pública.

Orgulho Gay? Pra que? Todos somos iguais. Só que os homossexuais só são iguais na hora de pagar os impostos, porque muitos dos direitos civis ainda não foram alcançados por essa população.

Em geral, temos a falta de generosidade com o outro ao proclamar a igualdade no papel para deixar debaixo do tapete as brutais diferenças da realidade.

Gostaria de fazer um mea culpa. Eu sou branco e como tal achei meio absurdo, um privilégio, quando saíram as cotas para negros nas universidades. Me posicionei contra e achei que estava filiado ao pensamento do ator e militante negro Milton Gonçalves que também, na época, se declarou contra as cotas. Claro que foi um engano ideológico meu, Milton tem suas razões profundas, as minhas eram a de temer pelos tais privilégios, eram rasas.

Minha opinião mudou quando olhei para o meu mundo e percebi verdades claras de um sujeito que se acha pouco preconceituoso. Estudei em duas universidades consideradas de qualidade e tanto a Puc- SP como a Usp tinham negros na minha sala. Eles estavam por lá, mas não como estudantes, estavam como assistentes, eram faxineiros, secretários, técnicos de laboratório.

Durante 8 anos que estudei cinema na Eca/Usp, teve apenas um negro na faculdade. Era Jeferson De, autor do Dogma Feijoada, manifesto que agitou os meios cinematográficos do país e dizia que “o negro brasileiro deve traduzir a sua própria realidade na tela”. Jeferson está atualmente lançando seu longa “Bróder”. Isto é, teve que ser um negro excepcional, pois só assim ele pode entrar em um curso cheio de brancos medianos – eu inclusive.

No melhor curso de cinema do país na época durante 8 anos teve apenas um negro como estudante, que teve que provar ser acima da média para poder estar no meio de nós. Refletir sobre isso, mudou totalmente minha opinião sobre um assunto polêmico como foi – e não deveria ser – as cotas de negros.

Existe alguma coisa bem errada no discurso sobre as tais “vantagens” que as minorias querem ter. Como existia algo de errado na minha opinião sobre as cotas e minha visão de privilégio dos negros. Pense nisso quando achar que os gays são cheios de privilégios e estão por cima, pois muitos continuam apanhando nas ruas apenas por serem gays e nada mais. E isso não é nenhum sinal de supremacia ou vantagem.

Escrito por Vitor Angelo às 16h57
Folha de SP - 14/08/11

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

PORTARIA Nº 1.353, DE 13 DE JUNHO DE 2011 – DOAÇÃO DE SANGUE - orientação sexual não deve ser usada como critério para seleção de doadores de sangue



















O MINISTRO DE ESTADO DA SAÚDE, no uso das atribuições que lhe confere o inciso II do parágrafo único do art. 87 da Constituição, e

Considerando a Lei nº 7.649, de 25 de janeiro de 1988, que estabelece a obrigatoriedade do cadastramento dos doadores de sangue, bem como a realização de exames laboratoriais no sangue coletado, visando a prevenir a propagação de doenças;

Considerando a Lei nº 10.205, de 21 de março de 2001, que regulamenta o § 4o do art. 199 da Constituição, relativo à coleta, processamento, estocagem, distribuição e aplicação do sangue, seus componentes e derivados e estabelece o ordenamento institucional indispensável à execução adequada dessas atividades;

Considerando Decreto nº 3.990, de 30 de outubro de 2001, que regulamenta o art. 26 da Lei nº 10.205, de 21 de março de 2001, que dispõe sobre a coleta, processamento, estocagem, distribuição e aplicação do sangue, seus componentes e derivados, e estabelece o ordenamento institucional indispensável à execução adequada dessas atividades;

Considerando o Decreto nº 5.045, de 8 de abril de 2004, que dá nova redação aos arts. 3º, 4º, 9º, 12 e 13 do Decreto nº 3.990, de 30 de outubro de 2001, que regulamenta os dispositivos da Lei nº 10.205, de 21 de março de 2001; e

Considerando a Consulta Pública SAS/MS nº 24, de 1º de junho de 2010, que submete à avaliação a minuta da portaria que trata dos Procedimentos Hemoterápicos, resolve:

Art. 1º Aprovar, na forma do Anexo a esta Portaria, o Regulamento Técnico de Procedimentos Hemoterápicos.

§ 1º O Regulamento Técnico, de que trata esta Portaria, tem o objetivo de regular a atividade hemoterápica no País, de acordo com os princípios e diretrizes da Política Nacional de Sangue, Componentes e Hemoderivados, no que se refere à captação, proteção ao doador e ao receptor, coleta, processamento, estocagem, distribuição e transfusão do sangue, de seus componentes e derivados, originados do sangue humano venoso e arterial, para diagnóstico, prevenção e tratamento de doenças.

§ 2º O Regulamento Técnico deverá ser observado por todos os órgãos e entidades, públicas e privadas, que executam atividades hemoterápicas em todo o território nacional no âmbito do Sistema Nacional de Sangue, Componentes e Derivados (SINASAN).

§ 3º A doação de sangue deve ser voluntária e altruísta.

§ 4º Os serviços de hemoterapia deverão capacitar os técnicos da Hemorrede e de suas unidades vinculadas de saúde para melhoria de atenção e acolhimento aos candidatos à doação, evitando manifestação de preconceito e discriminação por orientação sexual, identidade de gênero, hábitos de vida, atividade profissional, condição socioeconômica, raça/cor e etnia.

§ 5º A orientação sexual (heterossexualidade, bissexualidade, homossexualidade) não deve ser usada como critério para seleção de doadores de sangue, por não constituir risco em si própria.

Art. 2º A execução das ações de vigilância sanitária, controle de qualidade e vigilância epidemiológica no território nacional fique a cargo dos órgãos de apoio do SINASAN, conforme previsto no art. 9º da Lei nº 10.205, de 21 de março de 2001, os quais cabe a definição de estabelecimento e que definam a forma para realização dessas ações em regulamentos próprios dos órgãos de vigilância em saúde.

Art. 3º Para o cumprimento do Regulamento Técnico de que trata esta Portaria, devem ainda, ser obedecidos os requisitos sanitários para funcionamento de serviços de hemoterapia definidos pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA).

4º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 5º Fica revogada a Portaria nº 121/SVS/MS, de 24 de novembro de 1995, publicada no Diário Oficial da União nº 229, de 30 de novembro de 2010, Seção 1, p. 79.

FONTE: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2011/prt1353_13_06_2011.html


segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Para antropóloga, imagem do deputado Bolsonaro em propaganda de roupa íntima seria desrespeito às mulheres e aos gays



















DEBORA DINIZ*

O deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ) foi convidado para ser garoto-propaganda da Duloren, empresa especializada em roupas íntimas. Bolsonaro não é nenhum deus grego que inspire mulheres a comprar calcinhas. Não é seu corpo que importa à Duloren, mas suas opiniões sobre sexo, gays e mulheres. A atual campanha da Duloren de moda para homens no site da empresa traz a imagem de um desses modelos perfeitos sendo admirado por um pit bull. O slogan da campanha é "perigoso, viril e arrebatador". Minha dúvida foi se a chamada era para o cachorro ou para o modelo. O cachorro e o modelo estão de cueca, a diferença é que o cachorro a usa entre os dentes. Imaginei a atualização da campanha com Bolsonaro como modelo para a venda de calcinhas. Com o slogan "machão, conservador, homofóbico", Bolsonaro ocuparia bem o lugar do pit bull.

O comércio de roupas íntimas transita entre símbolos contraditórios sobre o corpo e a sexualidade: o proibido e o desejado, o vulgar e o íntimo. Bolsonaro e as calcinhas representarão a força do vulgar, mas com alta dose de desrespeito às mulheres e aos gays. Não consigo imaginá-lo vestindo calcinha na campanha, o que seria um contrassenso ainda maior, considerando sua posição de parlamentar. Portanto, sua aparição deve ser como a de quem admira ou aprova mulheres vestindo calcinhas. Exatamente o lugar de censor moral no qual hoje ele vocifera como deputado ou, na iconografia da Duloren, o lugar do pit bull que admira os homens: o senhor da heterossexualidade, a favor de que as mulheres retornem à casa e ao cuidado dos filhos, e contra a igualdade sexual. Há outras cores de conservadorismo na voz do quase modelo da Duloren: revisionismo da ditadura como opressão, defesa da pena de morte, além das recentes controvérsias sobre racismo.

O que fez a Duloren imaginar que Bolsonaro inspiraria as mulheres a comprar calcinhas? Apostar na ironia seria o caminho confortável e menos controverso, mas também pouco provável para uma empresa que se rege pelo lucro. Bolsonaro não seria um modelo, mas um contramodelo para a intimidade feminina. Ao comprar uma calcinha aprovada por ele, as mulheres negariam os valores subliminares da campanha. Bolsonaro não seria o censor que se imagina ser, mas uma paródia de seu colega Tiririca no campo da sexualidade feminina: o humor sexual moveria o comércio das calcinhas. Acho pouco provável uma aposta de risco como essa. Uma campanha de sucesso é aquela cuja mensagem não deixa dúvida sobre sua eficácia, semelhante à promovida pela Duloren que envolvia um padre e uma modelo com roupas íntimas, ambientada na Praça de São Pedro. A modelo segurava uma cruz em direção ao padre, sugerindo que a lingerie provocaria o espírito libidinoso dos padres. Não havia dúvidas quanta à mensagem dessa campanha, o que deixou a Igreja Católica justamente indignada.

Minha aposta sobre o sentido da campanha é outra. Não há subliminaridades em Bolsonaro como garoto-propaganda, assim como no uso da cruz e do padre na campanha anterior. A Duloren aposta no símbolo do machão como o de um bom vendedor de calcinhas, assim como apostou no modelo perfeito e no pit bull para vender cuecas para homens. É o sentido do machão na cultura brasileira que será negociado pela campanha. Gostar de mulheres e, mais ainda, de mulheres lindas vestindo calcinhas sedutoras, seria um ato de masculinidade. Para admirar mulheres na intimidade, somente homens machões. Mas machão aqui não se resume à ordem heterossexual do desejo - confunde-se com a homofobia, a opressão de gênero e a redução das mulheres a objeto de posse dos homens. O machão censor da sexualidade e do corpo das mulheres está em baixa e a Lei Maria da Penha é um sinal vigoroso da sociedade brasileira sobre essa mudança de mentalidade e práticas de gênero.

Não sei se Bolsonaro ajudará a Duloren a vender calcinhas, mas a Duloren o ajudará a se manter como o deputado federal censor da sexualidade. Afirmar-se como machão e defensor da heteronormatividade faz os parlamentares se projetarem, nem que seja pelo espanto medieval. O sinal mais recente dessa atualização do machão foi a aprovação da lei para a criação do Dia do Orgulho Heterossexual pela Câmara Municipal de São Paulo. Foram 31 votos pela aprovação contra 19, com forte hegemonia dos partidos conservadores na defesa da lei. Assim como na campanha da Duloren, há várias incongruências na lei, sendo a mais importante a inversão da ordem moral - quem é discriminado é o gay, e não o heterossexual. Não se mata um casal heterossexual na rua, mas se violentam pai e filho que expressam carinho em público. A homofobia mata, mas é a heteronormatividade que define as leis e, como gorjeta, pode ajudar o capitalismo a vender calcinhas.

* DEBORA DINIZ É ANTROPÓLOGA, PROFESSORA DA UnB E PESQUISADORA DA ANIS - INSTITUTO DE BIOÉTICA, DIREITOS HUMANOS E GÊNERO


quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Homofobia e lei penal



















Homofobia e lei penal

NOTAS SOBRE O SUBSTITUTIVO AO PROJETO DE LEI 122

*Roger Raupp Rios

O objetivo desta nota é contribuir, do ponto de vista jurídico, com a reflexão sobre o substitutivo ao Projeto de Lei nº 122, que criminaliza a homofobia. A redação do substitutivo que ora se noticia, se comparada aos termos originais, suscita muitas indagações jurídicas. Dada a importância e a necessidade do combate à homofobia, é imprescindível colaborar, trazendo ao debate, ainda que de modo pontual e sucinto, alguns tópicos de grande relevância.

Nesta nota, são apenas suscitados alguns tópicos que saltam aos olhos à primeira vista, merecendo aprofundamento e aperfeiçoamento no projeto, desde sua concepção até seus conceitos e estrutura. Não se pretende qualquer apreciação exaustiva, nem definitiva, sequer sobre os pontos listados.

Com efeito, os direitos humanos e fundamentais requerem, para sua efetividade, uma série de medidas por parte do Estado e da sociedade. No caso do direito de igualdade, cujo conteúdo jurídico exige o combate a toda forma de discriminação, são necessárias medidas protetivas, inclusive por meio do direito penal, dada a intensidade de certas modalidades de discriminação e a gravidade das lesões daí decorrentes. Este, sem dúvida, é o caso da discriminação contra homossexuais, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais, denominada de “homofobia”. No mundo todo há registros constantes e persistentes de grave violência física e simbólica contra tais indivíduos e grupos.

NOTA 1: sobre a criminalização da homofobia.

Sobre o ponto, reproduzimos manifestação lançada no jornal Folha de São Paulo (edição de 25 de agosto de 2007, por Roger Raupp Rios):

Um instrumento justo e necessário

UM dos desafios básicos para a democracia no Brasil é a construção de uma sociedade sem discriminações, em que a liberdade de cada um conduzir sua vida de modo autônomo seja respeitada. Para tanto, é preciso agir em várias frentes: medidas educativas, oportunidades de participação política e serviços públicos de saúde, segurança e justiça preparados para lidar com a diversidade -tudo isso é necessário.

Nesse contexto, a legislação antidiscriminatória se revela, ao lado das demais iniciativas, um dos instrumentos mais importantes. Não é por acaso que, desde o final do nazi-fascismo, preconceito e discriminação têm sido criminalizados. No Brasil, por exemplo, a lei nº 7.716/1989 define como crime tratamentos prejudiciais por raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.

As funções que a legislação penal cumpre são insubstituíveis: além de possibilitar a punição de atentados graves contra a vida, a liberdade, a igualdade e a dignidade humana, a lei penal tem caráter pedagógico e simbólico. Ela aponta quais são os bens jurídicos mais relevantes, dentre os quais se inclui, sem dúvida, numa sociedade democrática e pluralista, o respeito à diversidade.

Tudo isso se torna urgente quando preconceitos, costumes e visões de mundo se voltam contra cidadãos pelo simples fato de não se identificarem ou não serem percebidos como heterossexuais (homofobia).

Desde há muito, homossexuais, bissexuais, travestis e transexuais sofrem agressões físicas e morais intensas: assassinatos, espancamentos, ofensas verbais, demissão do emprego e exclusão escolar são terrível e vergonhosamente freqüentes. Essa dinâmica é alimentada, direta e indiretamente, por opiniões e atitudes intolerantes diante de tudo que contrarie essa mentalidade heterossexista.

Nesse quadro, a inclusão da homofobia entre as formas de discriminação penalmente puníveis é justa e necessária. Necessária porque, além de ter caráter repressivo pela punição de atos homofóbicos, atua preventivamente, evitando e desencorajando tais práticas. Justa porque fortalece o respeito à diversidade e à dignidade humana, sem o que não há garantias para a igual liberdade de todos, independentemente de cor, origem, religião, sexo, orientação sexual, identidade de gênero ou outras formas de discriminação. Deixar a homofobia fora da lista de discriminações que a lei penal sanciona é atentar gravemente contra a democracia, a liberdade e a dignidade humanas, relegando um sem-número de cidadãos a uma cidadania de segunda classe.

Ao mesmo tempo, é minar o convívio pluralista e tolerante, sem o que ninguém pode sentir-se seguro de que não será discriminado em virtude de sua identidade ou escolhas fundamentais relacionadas a cor, origem, religião, raça, sexo, gênero, orientação sexual, deficiência ou idade.

No caso da homofobia, há muito que avançar, pois homossexuais, travestis e transexuais ainda são estigmatizados e subjugados como seres abjetos.

Não se trata de cerceamento das liberdades de opinião ou de religião. Assim como na proibição do racismo, o que se quer evitar é que a injúria e a agressão, fomentadoras do ódio e da violência, campeiem sem restrições, pondo em risco e ofendendo a vida e a dignidade.

A proibição de discursos e práticas discriminatórias não inviabiliza as liberdades de opinião, crença e manifestação. Ao contrário, a prática das liberdades no mundo plural requer seu exercício sem violência ou intolerância (como, aliás, legitimamente ocorre na criminalização do escárnio público de alguém por crença religiosa).

Prover o Brasil dos instrumentos para combater a homofobia é tanto mais necessário quanto mais vulneráveis são os indivíduos e grupos objeto de preconceito e quanto mais intensa é a discriminação.

Trata-se não só de imperativo constitucional e de compromisso democrático como também do respeito que é devido a todos os seres humanos, independentemente de identidade, preferência ou orientação sexual.

NOTA 2: o regime geral no direito penal antidiscriminatório brasileiro (Lei nº 7.716/1989) e a apartação do substitutivo

Ponto de extrema importância é o tratamento legislativo separado por proposto para a homofobia. O substitutivo cria um regime legislativo que aparta a proteção jurídica penal em face da homofobia diante de outras formas de discriminação, cuja proteção jurídica penal se insere na Lei 7716/1989 (que trata dos crimes decorrentes do preconceito por raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional).

Do ponto de vista jurídico, não há motivo para esta separação legislativa. Ao contrário, ela prejudica o desenvolvimento e a efetividade do direito antidiscriminatório brasileiro, não trazendo nem segurança jurídica, nem coerência ao sistema jurídico e à aplicação da lei.

Além disso, as esferas jurídicas protegidas pelo substitutivo estão aquém da proteção propiciada pela Lei 7716/89, caracterizando um tratamento desigual e discriminatório em face dos diversos grupos sujeitos à discriminação, a princípio, vício de inconstitucionalidade. Isso sem se falar na proteção jurídica insuficiente, dada a omissão em áreas onde o enfrentamento da discriminação homofóbica é imprescindível, o que também compromete a constitucionalidade do substitutivo.

Neste contexto, a opção pelo tratamento da homofobia de modo apartado à lei geral antidiscriminatória não é mera opção legislativa, mas aponta para uma desvalorização da proteção jurídica quando o assunto é homofobia.

Nota 3: “sexo”, “orientação sexual” e “identidade de gênero” na redação do substitutivo

O texto substitutivo adota uma compreensão do conceito de “sexo” muito restrita, diminuindo, de forma inconstitucional, a proteção jurídica que os tratados internacionais de direitos humanos e a Constituição prevêem. Isto porque, quando o ordenamento jurídico se utiliza destes termos, especialmente o termo “sexo”, não se alcança somente a distinção entre “homens e mulheres”, considerados biologicamente, como também toda a discriminação motivada pelo gênero (vale dizer, as representações culturais, da masculinidade e da feminilidade).

Tanto assim que, por exemplo, um homem heterossexual, por ser considerado “afeminado”, poderá sofrer discriminação por motivo de sexo (aqui englobando, logicamente, o gênero, isto é, repita-se, as representações culturais associadas ao sexo biológico). Esta compreensão, a propósito, está presente desde o final dos anos 1950 na jurisprudência da Corte Européia de Justiça.

Ainda que não pareça querer restringir a idéia de gênero ao campo da “identidade de gênero”, o texto substitutivo somente faz menção ao gênero em tal contexto, o que pode induzir a interpretações restritivas, que protegem de modo insuficiente contra a discriminação.

No que se refere à “orientação sexual”, a definição proposta pelo substitutivo não esclarece qual elemento qualifica, para fins de aplicação da lei, quem são os destinatários da proteção antidiscriminatória. É necessário definir de modo mais claro quando alguém ou alguma situação configura discriminação em relação à “homossexualidade”, “heterossexualidade” e “bissexualidade”.

Pergunta-se: trata-se de proteção de alguém que se identifica como tal ou que é identificado por terceiros, esteja este sujeito de acordo ou não com a identificação alheia? Por exemplo: se Pedro é discriminado por um agente público, em virtude deste atribuir-lhe a identidade homossexual, apesar de Pedro só se interessar sexualmente pelo sexo oposto, configura-se a hipótese protegida contra discriminação? Se algum agente privado percebe troca de amabilidades entre dois heterossexuais e os discrimina por este fato, incide o comando legal? Se Maria tem uma conduta sexual dirigida a outra mulher, e se delcara heterossexual, está protegida? Estas hipóteses deixam claro que é necessário definir “orientação sexual” de modo mais claro e preciso, tanto para propiciar segurança jurídica, quanto para tornar mais efetiva a legislação.

Considera-se, para início do debate, que não é tarefa da legislação nem da ciência jurídica definir o que são “sexo”, “orientação sexual” e “identidade de gênero”. Tais definições são totalmente inapropriadas para a ciência jurídica, sendo objeto de outros campos do saber e da dinâmica social e cultural.

Ao invés disso, a lei andará muito melhor se definir o âmbito de proteção antidiscriminatória, a partir do conceito jurídico constitucional de discriminação. Nos seus termos, pode-se assim sugerir:

“Para os fins desta lei, constitui discriminação qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência, motivada por motivo de sexo, orientação sexual ou identidade de gênero, que tenha o propósito de anular ou prejudicar o reconhecimento, gozo ou exercício em pé de igualdade de direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos econômico, social, cultural ou em qualquer campo da vida pública.

A seguir, pode-se inserir um artigo explicitando hipóteses de discriminação conforme os critérios listados, do seguinte modo:

Para os efeitos do artigo anterior, consideram-se “discriminação por motivo de sexo” as distinções, exclusões, restrições ou preferências relacionadas a referências biológica, morfológica, genética, hormonal ou qualquer outro critério distintivo que importe nas designações sexuais relativas a homens e mulheres; “discriminação por motivo de orientação sexual” as distinções, exclusões, restrições ou preferências relacionadas a identidade, comportamento, preferência, conduta, ou qualquer outro critério distintivo, que importe na atribuição da homossexualidade, heterossexualidade ou bissexualidade; “discriminação por motivo de identidade de gênero” as distinções, exclusões, restrições ou preferências relacionadas a identidade, comportamento, preferência, conduta, ou qualquer outro critério distintivo, que importe na atribuição da condição travesti ou transexual.

Parágrafo único: a proteção às discriminações referidas alcança as distinções, exclusões, restrições ou preferências relacionadas ao gênero, não importa o sexo, a orientação sexual ou a identidade de gênero dos envolvidos.

Por fim, ainda quanto a este ponto, é necessário explicitar, na linha dos tratados internacionais de direitos humanos e do direito antidiscriminatório, que ações afirmativos que considerem sexo, orientação sexual ou identidade de gênero, por não constituírem discriminação, mas, ao contrário, medidas de combate à discriminação, não configuram discriminação.

Neste sentido:

“Para os efeitos desta lei, não são consideradas discriminação as medidas especiais, tomadas com o objetivo de assegurar a progresso adequado de grupos discriminados, bem como o enfrentamento da discriminação por eles experimentada, a fim de propiciar a proteção necessária para o gozo e o exercício de direitos humanos e liberdades fundamentais.”

NOTA 4: sobre a limitação das esferas protegidas no substitutivo

A limitação da proteção penal somente para as esferas do mercado de trabalho, das relações de consumo e para hipótese de incitação de violência é inadequada e deixa faltando, do ponto de vista penal, toda a proteção contra discriminação que a Constituição exige em muitas outras esferas essenciais da vida.

Basta um rápido olhar sobre o direito já existente, especialmente as Leis nº 7.716 (com as redações das Leis nº 9.459/1997 e 12.228/2010) e a nº 7.437/1985:

a) na oferta e prestação de serviços públicos (comparar com a Lei nº 7.716, art. 12);

b) no âmbito educacional, público ou privado (comparar com a Lei nº 7.716, art. 6º);

c) nos meios de comunicação (comparar com a Lei nº 7.716, art. 20, p. 2º), inclusive pela internet (art. 20, p. 2º, III);

d) nos serviços de saúde, públicos ou privados;

e) nas relações de família (comparar com a Lei nº 7.716, art. 14);

f) em diversos espaços de convívio social (comparar com a Lei nº 7.716, arts. 9º e 11);

g) nas Forças Armadas (comparar com a Lei nº 7.716, art. 13);

Com efeito, as esferas acima indicadas registram altíssimo grau de discriminação homofóbica, especialmente as relações de família, saúde, educação e meios de comunicação social.

CONCLUSÃO

Esta nota é somente uma contribuição para o debate jurídico do substitutivo apresentado ao PL 122, onde alguns pontos são destacados. Muitos outros requerem exame e atenção, que, por espaço e tempo, aqui não foram objeto de atenção. O que se espera, com sua elaboração, é colaborar para a efetividade do direito de igualdade e o aperfeiçoamento do direito antidiscriminatório brasileiro.

*Juiz Federal, doutor em Direito, Professor do Mestrado em Direitos Humanos da UNIRITTER

Publicada em: 13/07/2011 às 11:20 artigos e resenhas CLAM

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Homofobia, Ibope e os avanços na opinião pública no Brasil



















A pesquisa do Ibope Inteligência sobre atitudes da população brasileira em relação a lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais (LGBT), publicada no último dia 28 de julho, traz alguns dados muito reveladores sobre a evolução da opinião pública a este respeito.

Há 18 anos foi publicada outra pesquisa do Ibope em relação ao mesmo assunto. Em 1993, segundo aquela pesquisa, 44% não mudariam sua conduta com o colega se soubessem que era homossexual. Pesquisa de 2008, também do Ibope, indicou que 65% aceitariam. Já em 2011, 73% dos entrevistados não se afastariam se descobrisse que um amigo é gay. Em 1993, 55% não trocariam de médico se descobrissem que era gay. Hoje, 67% são totalmente a favor de médicos homossexuais no serviço público. No que diz respeito à revelação de um(a) amigo(a) ser gay ou lésbica, 80% das mulheres, 81% dos jovens de 16 a 24 anos e 85% das pessoas com nível superior de escolaridade não se afastariam.

É muito alentador observar que, segundo a nova pesquisa do Ibope, 52% das mulheres, 50% dos católicos, 60% dos jovens de 16 a 24 anos e 60% dos com nível superior são favoráveis à união estável entre casais homoafetivos. Em 1993, o assunto nem tinha entrado na pauta do legislativo ou do judiciário, tanto é que a pesquisa do Ibope daquela época nem perguntou sobre isso. No entanto, tínhamos acesso a outras pesquisas que apontavam que havia apoio de apenas 7% da população a esta forma de união. Hoje 45% da população estão a favor.

Vale lembrar que em 1995, existiam apenas 35 grupos LGBT organizados e nenhuma organização nacional. Não havia nenhuma Parada LGBT. Hoje o panorama mudou: há 9 redes nacionais LGBT, pelo menos 250 Paradas LGBT e mais de 300 ONG LGBT em todo o Brasil. Sem dúvida, a organização política do segmento tem contribuído em muito para as mudanças favoráveis que vêm ocorrendo na opinião pública. Neste ano de 2011 vamos para a II Conferência Nacional dos Direitos Humanos da Comunidade LGBT, convocada pela presidenta Dilma Rousseff, que será precedida por Conferências Estaduais LGBT convocadas por todos e todas os(as) governadores(as). Nestas Conferências avaliaremos todas as políticas públicas existentes em nosso país contra a violência e a discriminação e pela cidadania das pessoas LGBT.

Também com base na nova pesquisa, pode-se afirmar que as atitudes homofóbicas têm suas raízes em valores machistas da nossa cultura, na intolerância de certos setores religiosos e na falta de acesso a informações corretas sobre a homossexualidade: 63% dos homens, 77% dos evangélicos e 68% dos com estudo até a 4ª série do ensino fundamental afirmaram ser contrários à união estável entre casais homossexuais. Mesmo aqui há uma evolução se compararmos com a Idade Média, quando éramos queimados na fogueira pela Santa Inquisição, inclusive ainda há 7 países com pena de morte para os homossexuais. Depois a homossexualidade foi considerada crime em muitos países, e ainda há ainda 75 onde ser gay é crime. E no Século XX, até o dia 17 de maio de 1990, a homossexualidade era considerada uma doença pela Organização Mundial da Saúde. Estamos, sim, avançando muito.

Seria muito interessante ter outra pesquisa desta natureza daqui a 10 anos. Se continuar na mesma tendência de aumento de respeito às pessoas LGBT, em especial entre os jovens, o Brasil não será mais um país em que uma pessoa LGBT é assassinada a cada dois dias, e sim um país de respeito e aceitação da diversidade sexual. Para isso, nas palavras de Tony Blair, é preciso três coisas: educação, educação e educação, assim como investimento em políticas públicas.

Além de investir firme na educação e em políticas públicas, o movimento LGBT precisa aprimorar sua parceria com a juventude e com as mulheres, tendo em vista que são o público que mais nos apoia. Também é preciso abrir uma frente de diálogo com os 50% dos católicos, os 23% dos evangélicos e os 60 % de outras religiões que nos respeitam, para que semeiem a boa nova da Constituição Federal, principalmente os artigos 3º e 5º que estabelecem que todos são iguais perante a lei e que não haverá discriminação de qualquer natureza em nosso país, assim como fez o Supremo Tribunal Federal, que, numa decisão histórica e unânime, no dia 5 de maio de 2011, disse não à discriminação, e julgou a favor do reconhecimento da união estável entre casais homoafetivos, com base nos princípios da liberdade, da segurança jurídica , da igualdade de direitos e da laicidade do estado.

Seguindo a filosofia de Aristóteles, quando fala que a finalidade da vida é a felicidade, no último dia 19 de julho a Assembleia Geral das Nações Unidas aprovou uma resolução para que os governos deem mais importância à felicidade e ao bem-estar na elaboração de políticas públicas para alcançar e medir o desenvolvimento econômico e social. O reconhecimento da união entre pessoas do mesmo sexo e o respeito à cidadania pode contribuir muito para a felicidade de milhares de cidadãos e cidadãs LGBT no Brasil.


Toni Reis

Presidente da ABGLT – Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais e Conselheiro do Conselho Nacional de Lésbicas, Gays. Bissexuais, Travestis e Transexuais.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Estatuto da Diversidade Sexual - marco legal,histórico e social



















A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), por meio da Comissão de Diversidade Sexual, finaliza em agosto o Estatuto da Diversidade Sexual. O texto prevê uma série de normas e princípios com o objetivo de ampliar e resguardar direitos que ainda não estão disponíveis ou que ainda se encontram incompletos para a população LGBT.

Maria Berenice Dias, advogada especializada em direito homoafetivo e presidente da Comissão de Diversidade Sexual da OAB, afirma em entrevista ao CLAM que a iniciativa do Estatuto representa mais do que uma ação da classe. As discussões sobre o texto têm envolvido movimentos sociais, o que, segundo ela, será fundamental no momento em que o projeto for levado ao Congresso Nacional.

Leia abaixo a entrevista.

É possível afirmar que o Estatuto da Diversidade Sexual equivale para a população LGBT o que o Estatuto da Criança e do Adolescente significa para as crianças e os adolescentes e o que o Estatuto do Idoso significa para a terceira idade?

Sim, o propósito é este. Mais do que um marco legal, o Estatuto da Diversidade surge como um marco histórico e social, tal como foram os Estatutos do Idoso e da Criança e do Adolescente. Isso demonstra também que a iniciativa é uma ação importante para o reconhecimento da população LGBT em toda a sua diversidade, em meio a um cenário de barreiras e interdição de direitos.

O Estatuto é um microssistema que dispõe de normas, princípios e dispositivos que ampliam e resguardam os direitos em vários âmbitos. Além disso, é um importante sinalizador para a elaboração de políticas públicas que têm o papel de modificar a realidade.

Como têm sido as discussões sobre o Estatuto dentro da OAB? Qual o caminho do Estatuto após a aprovação dentro da entidade?

A OAB criou, no primeiro semestre deste ano, uma Comissão da Diversidade Sexual, da qual sou presidente. Existem comissões também nos estados. A movimentação dos grupos tem sido intensa. O órgão possui também consultores, e todos estão colaborando para a elaboração do texto.

A participação dos movimentos sociais tem sido muito importante, pois significa que a discussão não está restrita à classe. Nesse sentido, o Estatuto ganha relevância e valor por considerar a participação popular. E isso é determinante, pois o Estatuto, que deve ser finalizado até 18 de agosto, será posteriormente levado ao Congresso. A OAB apresentará o texto como proposta popular, o que injeta legitimidade na ação.

Qual a perspectiva da senhora para o andamento do texto no Congresso?

Eu estou confiante. Uma vez no Congresso, o texto terá um relator e as discussões serão necessárias. Haverá audiências públicas. Conhecendo as possíveis barreiras contra o Estatuto, a OAB preparou também uma emenda constitucional com o intuito de contornar e rechaçar o argumento de que as disposições do texto ferem a Constituição brasileira.

A conjuntura é favorável, sobretudo em função do reconhecimento da união civil entre pessoas do mesmo sexo aprovado recentemente pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Ressalto que a iniciativa do Estatuto é de amplo espectro, não é apenas uma ação da OAB. É uma ação da sociedade, que confere um peso relevante na hora em que o texto for apresentado e discutido. O carimbo da OAB e a participação popular serão fundamentais. A vez da população LGBT é agora. Os direitos têm sido reconhecidos pelo Judiciário. A chancela e o reconhecimento do Legislativo não podem ser descartados.

Qual o alcance que tal Estatuto tem?

O Estatuto trata de diversas prerrogativas que ainda não estão ao alcance da população LGBT. Pelo texto, todos os direitos devem ser iguais e isso inclui o casamento, a adoção de crianças, o acesso incondicional à educação, à saúde, ao mercado de trabalho e à dignidade da pessoa LGBT diante de manifestações homofóbicas.

Sendo aprovado e chancelado pelo Congresso Nacional, o Estatuto da Diversidade Sexual ganha valor inclusive criminal, pois prevê a criminalização da homofobia, com previsão de agravante para crimes com essa motivação.

É importante ressaltar que o Estatuto avança sobre a histórica omissão em relação às travestis e aos indivíduos transexuais. Por isso, o texto busca ampliar e garantir o acesso pleno aos mecanismos que envolvem a redesignação corporal, o tratamento hormonal, o uso do nome social. Nesse último caso, existe a previsão de que esses indivíduos frequentem as dependências conforme o sexo social, e não o sexo do registro.

O Estatuto tem uma finalidade didática e transformadora. A sociedade aos poucos vai se acostumando a lidar com a temática LGBT, com a temática da diversidade.

A senhora destaca a importância do Judiciário, nos últimos anos, na ampliação dos direitos da população LGBT. Qual a sua avaliação sobre o papel do Legislativo e do Executivo?

O Congresso brasileiro tem se mostrado omisso. Já o Executivo tem feito a lição de casa, demonstrando preocupação com a interdição de direitos, com as dificuldades sociais e culturais que pesam sobre os indivíduos LGBT e com a elaboração de políticas que visem enfrentar as barreiras.

O Estatuto, transitando no Congresso, será relevante também pois vai provocar os agentes legislativos a debaterem essa temática. Dessa forma, esperamos que as discussões avancem e resultem em reconhecimento.

Dentro do Congresso, após o reconhecimento da união civil pelo STF, houve uma divisão entre aqueles que defendem o casamento e aqueles que defendem a criminalização da homofobia. A senhora acredita que essa dissonância de bandeiras venha a ter algum impacto na tramitação do Estatuto no Congresso?

Não, de forma alguma. Não vejo dissonância. O movimento é plural. Acredito que a própria variedade de tendências reflita o crescimento que a questão LGBT tem alcançado nos últimos anos. Não há dissonância ou divergências. Existem prioridades distintas que só vêm a somar para a causa. Penso que a tendência é avolumar. Mesmo que haja prioridades diferentes, o Estatuto surge para unificar todas as demandas e tem como meta abarcar todos os direitos que ainda não estão plenamente garantidos ao segmento LGBT.

Publicada em: 27/07/2011 às 12:00 entrevista ao CLAM - Centro Latino-americano em Sexualidades e Direitos Humanos